Obra mostra a diversidade de pessoas que passam pelo local

Fonte por Simone Candida para Jornal O Globo

Quem pedala, caminha ou corre pela Vista Chinesa — ou pretende incluir o passeio em seus roteiros futuros — deveria ficar atento não apenas à beleza do Alto da Boa Vista, mas à riqueza das histórias dos frequentadores da trilha urbana que rasga a Floresta da Tijuca. É o que sugere o livro A Vista do Rio – Histórias e personagens da Vista Chinesa, publicação de quase duzentas páginas que homenageia 17 pessoas que podem ser encontradas por aquelas curvas.

Escrito por dois apaixonados pelo ponto turístico, Gustavo da Rocha Lima e Luiza Mussnich, em coautoria com o fotógrafo Alex Ward, o livro, que lançado esta semana, mostra a diversidade humana que se exercita, trabalha ou simplesmente se deixa levar pelo cenário: tem um padre ciclista que passa a mil por hora, irreconhecível por estar sem batina; um policial do Batalhão de Operações Especiais (Bope) que corre, orgulhoso, com camisa oficial da corporação; atletas que treinam carregando pneus e muitos famosos, como o ator Rodrigo Hilbert e o músico Dado Villa-Lobos.

A primeira parte do livro remonta a memória do lugar e prepara o leitor para as crônicas. Coube à pesquisadora Patricia Pamplona apresentar dados históricos e curiosidades, além de fotos inéditas produzidas desde 1890.

— Ela fala da ligação da região com a imigração chinesa, do espaço como área de lazer do imperador e da elite, mais tarde, a inauguração do mirante, e ainda a escolha da Vista como cenário de filmes nacionais e estrangeiros — conta Gustavo da Rocha Lima.

Fotos antigas mostram imagens da Vista Chinesa e da Praça Afonso Viseu, no início do século XX. A inauguração do pavilhão da VistaChinesa, em 1903, foi marcada por um solenidade: o prefeito Franscisco Pereira Passos levou o presidente da república, Rodrigues Alves, junto com ministros, generais e políticos a realizar um passeio pelo Alto da Boa Vista, percorrendo a Mesa do Imperador e a Vista Chinesa. Segundo o livro, o pavilhão de madeira inaugurado nesta época, após ter sido destruído num temporal, foi substituído por outro, feito de cimento, de 1906. Fotografias e recortes de jornal ilustram este trecho da narrativa.

De acordo com os autores, a Vista Chinesa já tinha este nome muito antes do pavilhão ter sido construído: a origem seria um pequeno acampamento de chineses (o Rancho dos Chinas), no início da década de 1810.Na segunda parte do livro, os autores se juntaram ao fotógrafo Alex Ward, figurinha conhecida da região, e selecionaram entre os muitos rostos que costumam ver por ali os personagens que fazem parte da rotina da Vista Chinesa.

Entre os entrevistados, além de Hilbert e Dado Villa-Lobos, estão o aposentado Jayme Buarque de Hollanda, a atleta Dani Genovesi, e a jornalista Renata Ceribelli.

— Algumas pessoas a gente já conhecia: alguns pedalavam com a gente, outros nós vemos quando passamos. E para o ciclista é um lugar perfeito, porque em 4,5 km você tem inclinação de 12%. Então, em uma hora, você faz um treinamento que é fantástico. Mas descobrimos que aquele é mais que um lugar de ciclismo. Ela tem a melhor vista do Rio — comenta Gustavo da Rocha Lima.

Entre pesquisa, a produção e a edição, foram nove meses de trabalho. Segundo Gustavo da Rocha Lima, a rapidez do o resultado reflete o envolvimento do trio com a via. Gustavo, por exemplo, é um ex-executivo que decidiu mudar o estilo de vida e incluiu as pedaladas na VistaChinesa em sua nova rotina. Luisa é jovem, uma triatleta que treina por ali, e Alex Ward ganha a vida clicando o vai e vém e a natureza daquela região e coleciona mais de 5 mil cliques.

– Eu me inspirei num livro chamado “Anônimos famosos”, que teve perfis de desconhecidos da cidade. Mas a ideia é mostrar que a Vista Chinesa não é só ciclismo. Além dos personagens, como o homem que sobe lendo, e depois descobrimos que era o primo do Chico Buarque de Holanda, vimos que ali tem um série de coisas: tem o IMPA (Instituto de Matemática Pura e Aplicada), tem um grupo de geografia da PUC que estuda a mata, tem um casal que tem um quiosque e vende barrinhas de cereal e isotônico na vista, tem as historia de superação, de pessoas que usaram o ciclismo para curar a depressão. Fomos identificando e chegamos a 17 personagens. Há mais histórias e pensamos até em fazer um nova edição para contá-las — diz Gustavo, esclarecendo que a seleção foi feita pelos três.

A maioria das entrevistas foi feita pessoalmente. Na casa ou no local de trabalho do entrevistado. A exceção foi o Rodrigo Hilbert, cuja agenda lotada impediu o encontro.

— A gente tentou marcar com o Rodrigo Hilbert várias vezes e não conseguia. Quando a gente ia marca, enfim, ele foi para os Estados Unidos. A Luísa acabou fazendo uma bela crônica sobre ele intitulada “O inalcançável” — conta, rindo, Gustavo.