Área vinha sendo evitada porque poderia ser rota de fuga de traficantes


Fonte por Renan Rodrigues para Jornal O Globo

Após duas semanas de tensão provocada pela guerra entre traficantes na Rocinha, que teve reflexos em pelo menos 14 bairros vizinhos à mata no entorno da favela, o carioca aproveitou o domingo de sol em trilhas e áreas verdes.

Até a Vista Chinesa, que vinha sendo evitada por atletas e visitantes porque poderia ser usada como rota de fuga de traficantes, voltou a ser disputada por uma legião ansiosa para fazer selfies diante da paisagem da cidade. Os ciclistas também retomaram as pedaladas pelas ladeiras. A sempre concorrida Estrada das Paineiras, fechada aos veículos no domingo, no entanto, recebeu menos frequentadores que o habitual. Muitos, ainda apreensivos com o clima de insegurança, optaram por locais alternativos, como a pista Cláudio Coutinho, na Urca, onde militares do Exército garantem a segurança.

Era o caso da arquiteta Carla Rocha, de 50 anos, que optou por usar a pista de 1,25 quilômetro para o passeio com as amigas Graziele Martinez, de 36, e Verônica Guedes, de 39. Há duas semanas, elas planejavam desbravar o exuberante cenário da Floresta da Tijuca, a partir do Alto da Boa Vista. Foi quando os confrontos explodiram na Rocinha e começou a circular a informação de que, em fuga, criminosos estariam usando trilhas da região.

— Eu já subi a Floresta da Tijuca pela Estrada das Paineiras. Tínhamos marcado de ir porque ela (Graziele) não conhece, mas agora não dá. Vamos esperar. Há um ano eu já não me arrisco mais na Floresta da Tijuca. Fico pelo Jardim Botânico, na Lagoa e na Cláudio Coutinho. A Floresta da Tijuca é muito legal, tem trilhas, mas agora não dá para arriscar — afirma a arquiteta.

A aposentada Teresa Cristina Pereira, de 59 anos, também optou pela Cláudio Coutinho. Ela conta que, por três anos, levou turistas brasileiros — que visitavam a cidade para fazer treinamento na empresa do ex-marido — para conhecer a Vista Chinesa e a Mesa do Imperador. O passeio, hoje, não é recomendado, diz:

— Fazia sempre o trajeto pela Floresta da Tijuca. Era o roteiro número um para quem vinha ao Rio pela primeira vez. Hoje em dia, não tenho coragem de ir à Vista Chinesa, ainda mais depois que eu descobri que os bandidos podiam usar a mata e sair ali. Desde janeiro deste ano eu não vou mais. Durante três anos eu fiz esse percurso com amigos. Penso que vai demorar um pouco para a sensação de segurança melhorar.

Mas a beleza da Vista Chinesa falou mais alto para muitos. Entre as mais de 30 pessoas que se encantavam com o visual do Rio na manhã de ontem, estava o supervisor de obras Leandro Silva, de 33 anos, que arriscou o passeio — fora dos planos iniciais de domingo — com a mulher. E não se arrependeu.

— É a primeira vez na Vista Chinesa. Não estava pensando em vir aqui por causa da violência, mas estávamos no Parque Lage e resolvemos não perder o passeio. Estamos nos sentido seguros — disse o morador de Niterói.

A ciclista Daniela Azevedo, de 41 anos, também voltou a fazer o trajeto após duas semanas afastada:

— Treinava toda terça e quinta-feira, mas estou há duas semanas sem vir aqui. Voltei hoje, e espero continuar vindo.

A violência, que pegou carona na crise financeira do Estado do Rio, não intimida a todos. Entre muitos cariocas, o momento é de ocupar a cidade, como ensina Renata Araújo, de 34 anos, que levou os dois filhos, de 5 meses e 11 anos, para um passeio na região:

— Não pensei duas vezes antes de fazer o passeio. Temos que andar no Rio ou, caso contrário, não faremos mais nada. Temos que acreditar que há segurança.

Ao meio-dia, quando uma equipe do Jornal esteve na Vista Chinesa, seis policiais militares faziam a segurança no ponto turístico, e outros dois patrulhavam a Mesa do Imperador. O clima era outro na Estrada das Paineiras. Os poucos frequentadores reclamavam da falta de policiamento.

— Nunca deixei de vir. É um risco, mas uma vez por mês passo por aqui — disse o engenheiro Thiago Frenzoni, de 36 anos, que estava acompanhado dos amigos Bruno Borges, de 37, e Aline Castiglioni, de 34.

Antigos frequentadores vão voltando aos poucos às Paineiras, como o engenheiro Celso Lopes, de 53 anos, que pedalou na estrada depois de uma semana afastado:

— A região da Vista Chinesa e da Estrada das Paineiras é de grande potencial turístico. Pessoas do mundo inteiro vêm pedalar aqui. Eu voltei hoje e espero não parar mais.

Sobre a falta de policiamento na Estrada das Paineira, a Polícia Militar afirmou apenas que o patrulhamento, tanto lá como na Vista Chinesa, é realizado pelo Batalhão de Policiamento em Áreas Turísticas (BPTur). Em nota, a corporação acrescentou que, de acordo com uma resolução firmada recentemente, o BPTur passou a reforçar o patrulhamento na Vista Chinesa das 7h às 10h. Apesar de ser um parque federal, a Floresta da Tijuca tem a segurança feita apenas por batalhões da PM: o 6º BPM (Tijuca) e o 23º BPM (Leblon), além de contar com a presença do Comando de Polícia Ambiental (CPAm) e do próprio BPTur.